Tuesday, March 10, 2009

O direito a que, mesmo?

“Bispo Excomunga Família e Médicos que ajudaram a realizar o aborto na menina de 9 anos, em Recife”. A manchete estampada em vários jornais brasileiros na última semana retrata a história de uma criança pernambucana que foi violentada pelo padrasto e que, consequentemente, engravidou. A família da vítima, amparada por orientações médicas, optou pelo aborto levando-se em conta que a Legislação Brasileira permite a interrupção da gravidez nos casos de estupro e riscos para a gestante. A menina se encaixava nos dois quesitos. Não havia escolha!
No entanto, a notícia chamou a atenção pela forma radical com que a Igreja Católica agiu neste caso. Só a “Excomunhão” não fazia sentido. Para completar a ação punitiva aos que acreditam nos valores cristãos e impedir qualquer debate mais elaborado sobre temas como violência, mulher, saúde pública e solidariedade, a Igreja reforçou através do seu representante local que não excomungou também o agressor que brutalmente engravidou a criança por considerar este um crime menor que o aborto, pois não feriu o direito á vida. O direito à vida é ferido por crimes de diversas ordens, inclusive o da imposição das ações individuais ou coletivas.
A comparação apresentada pela instituição religiosa foi no mínimo, lamentável. Porque não dizer, idiota? Mais uma vez a Igreja mostrou-se incapaz de dialogar com a sociedade de forma clara, inteligente e menos alienada. Mostrou traços da veia autoritária que insiste em preservar mesmo que a sociedade diga não a esta prática danosa no mundo atual.
A Igreja Católica optou pela imposição da força do jargão “Direito à Vida” em meio aos “Mortos de Cidadania” que lidavam com as conseqüências da violência cotidiana. Esperava-se da instituição religiosa – e não só dela – uma atitude mais respeitosa em relação ao sofrimento da família da menina que também não teve direito à vida por inteiro. O direito à dignidade mostrou-se ferido, o direito a escolhas sensatas apareceu anulado, o direito a ter direitos, perdido.
Há de se considerar ainda que o Estado apareceu, neste caso, como eficiente e solidário no atendimento a criança vítima do estupro ao mesmo tempo em que não conseguiu mostrar-se suficientemente habilidoso para evitar este e tantos outros crimes que recheiam as estatísticas diárias dos números da violência em nosso País. O Estado é contraditório, falho, mas democrático. Conseguimos dialogar com Ele.
O momento é de cobrar abortos de imposição de pensamentos únicos, recortados, impostos. Opinião não se impõe, se discute, se forma por meio de argumentos. A Igreja criou um peso para os pobres cristãos envolvidos na excomunhão midiática e não tomou nenhuma medida para que este fato pudesse ajudar na construção de um debate mais justo sobre temas diversos. É hora de a Igreja olhar para trás e rever alguns dos seus conceitos. Talvez vire sal. Melhor assim!